O STF decidiu que a Competência para julgar os processos ajuizados pelo Ministério Público questionando contratações temporárias dos Municípios é da Justiça Comum.
Vejamos uma das decisões, confirmadas pela rejeição de Agravo de instrumento no dia 03/06/2009.
"DECISÃO
RECLAMAÇÃO. CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. DESCUMPRIMENTO DE DECISÃO PROFERIDA NA AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 3.395-MC/DF. CONTRATO TEMPORÁRIO. CREDENCIAMENTO DE PROFISSIONAIS DA ÁREA DE SAÚDE. RECLAMAÇÃO JULGADA PROCEDENTE.
Relatório
1. Reclamação, com pedido de liminar, ajuizada em 26.1.2007, pelo Município de Maurilândia/GO contra ato do Juízo da 2ª Vara do Trabalho de Rio Verde/GO, que, ao processar a Ação Civil Pública n. 01778.2006.102.18.00.2, teria afrontado a autoridade da decisão proferida na Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 3.395/DF.
O caso
2. Em 1º.12.2006, o Ministério Público do Trabalho ajuizou a Ação Civil Pública n. 01778.2006.102.18.00.2, perante o Juízo da 2ª Vara do Trabalho de Rio Verde/GO, objetivando compelir o Município de Maurilândia a: “a) abster-se de proceder [à] admissão de pessoal mediante credenciamento ou contratação temporária sob a modalidade de excepcional interesse público para as atividades da área de saúde, inclusive, no que diz respeito a atendimento dos Programas de Saúde da Família – PSF e de Agentes Comunitários de Saúde – PACS, ressalvadas apenas as questões de endemias e calamidade pública; b) abster-se de admitir pessoal permanente mediante simples prova de título ou pela modalidade de credenciamento ou assemelhada, ressalvada a seleção pública de agentes comunitários de saúde que, de qualquer forma, deve obedecer os princípios que regem a administração pública; (...); d)realizar, no prazo de 06 (seis) meses, concurso público para provimento de todos os cargos e/ou empregos públicos necessários para a substituição [de] seus atuais profissionais ‘credenciados’ ou admitidos sem concurso público (...); e) afastar, no prazo de 30 (trinta) dias após concluído o certame público, todos profissionais ‘credenciados’ ou contratados sem concurso público, substituindo-os por profissionais concursados” (fl. 54).
Em 7.12.2006, o Juízo da 2ª Vara do Trabalho de Rio Verde/GO deferiu parcialmente a liminar pleiteada pelo Ministério Público “para determinar que o Município de Maurilândia: 1)[se] abst[ivesse] de contratar novos trabalhadores sem prévia aprovação em concurso público ou de seleção pública para os casos dos agentes comunitários de saúde (...) ; e que, 2) apresent[asse] (...) a relação e o contrato de todos os profissionais que compõem o Programa de Saúde da Família e o Programa de Agente Comunitário de Saúde, na data da audiência inicial” (fl. 33).
É contra o processamento da Ação Civil Pública n. 01778-2006-102-18-00-2 perante a Justiça do Trabalho a presente Reclamação.
3. O Reclamante alega, em síntese, que a decisão reclamada afrontaria a autoridade da decisão proferida por este Supremo Tribunal Federal no julgamento da Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 3.395/DF.
Argumenta que “os contratos estabelecidos entre o Município e os profissionais de saúde não se enquadra[riam] no conceito de relação de emprego, por se tratar de questão regulada na lei civil” (fl. 5).
Pede que seja reconhecida “a competência da Justiça Comum Estadual para processar e julgar a Ação Civil Pública, em desfavor do Reclamante” (fl. 22).
4. Em 16.2.2007, a autoridade reclamada prestou informações (fls. 89-90).
5. Em 26.2.2007, deferi a liminar pleiteada para determinar a suspensão da Ação Civil Pública n. 01778.2006.102.18.00.2, até decisão final da presente Reclamação (fls. 162-168).
6. Em 21.3.2007, determinei a devolução das Petições Avulsas ns. 31.797/2007, 31.798/2007 e 33.443/2007, protocoladas pela Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho – ANPT, por considerar que a peticionária não teria sido admitida como amicus curiae na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 3.395/DF e, tampouco, sido parte ação civil pública objeto desta Reclamação (fls. 179-184).
7. Em 15.3.2007, o Ministério Público do Trabalho pleiteou a reconsideração da decisão que deferiu a medida liminar ou o julgamento pelo colegiado de agravo regimental (fls. 187-199).
Na oportunidade, defendeu a competência da Justiça do Trabalho para processar e julgar aquela ação, ao argumento de que o Município não teria demonstrado que “os trabalhadores potencialmente atingidos pela ação civil pública 01778-2006-102-18-00-2 est[ariam] investidos em cargos públicos ou em comissão (...) [não comprovando] o caráter institucional (em sentido estrito) das relações laborais em análise” (fl. 197).
8. Em 9.4.2007, a Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho – ANPT requereu “em sede de juízo de retratação, seja reconsiderado o despacho que indeferiu as Petições Avulsas STF n[s]. 31.797/2007, 31798/2007 e 33.443/2007 e determinou sua devolução à Agravante, prosseguindo o regular processamento do Agravo Regimental interposto contra a decisão que suspendeu a ação civil pública 01778.2006.102.18.00.2 em curso na 2ª Vara do Trabalho de Rio Verde-GO” (fl. 209).
9. O Procurador-Geral da República, em 3.4.2006, manifestou-se pelo não conhecimento do agravo regimental interposto pelo Ministério Público do Trabalho, ante sua ilegitimidade para atuar perante este Supremo Tribunal Federal. No mérito, opinou pela improcedência desta Reclamação, por entender que o Reclamante não teria comprovado “a natureza estatutária ou jurídico-administrativa do vínculo estabelecido entre os servidores e o poder público” (fls. 237).
Examinados os elementos havidos nos autos, DECIDO.
10. O que se põe em foco nesta Reclamação é a competência da Justiça do Trabalho para processar e julgar ação que versa, em essência, sobre a relação jurídica estabelecida entre servidores contratados temporariamente mediante ajuste de credenciamento e a Administração Pública, fundamentando-se o Reclamante na decisão da Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 3.395/DF.
11. Em 5.4.2006, no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 3.395/DF, este Supremo Tribunal Federal, por maioria, referendou cautelar deferida pelo Ministro Nelson Jobim, cujos termos são os seguintes:
“EMENTA: INCONSTITUCIONALIDADE. Ação direta. Competência. Justiça do Trabalho. Incompetência reconhecida. Causas entre o Poder Público e seus servidores estatutários. Ações que não se reputam oriundas de relação de trabalho. Conceito estrito desta relação. Feitos da competência da Justiça Comum. Interpretação do art. 114, inc. I, da CF, introduzido pela EC 45/2004. Precedentes. Liminar deferida para excluir outra interpretação. O disposto no art. 114, I, da Constituição da República, não abrange as causas instauradas entre o Poder Público e servidor que lhe seja vinculado por relação jurídico-estatutária” (DJ 10.11.2006).
Na decisão pela qual deferiu a medida liminar, ad referendum, o Ministro Nelson Jobim consignou:
“Dou interpretação conforme ao inciso I do art. 114 da CF, na redação da EC n. 45/2004. Suspendo, ad referendum, toda e qualquer interpretação dada ao inciso I do art. 114 da CF, na redação dada pela EC 45/2004, que inclua, na competência da Justiça do Trabalho, a ‘(...) apreciação (...) de causas que (...) sejam instauradas entre o Poder Público e seus servidores, a ele vinculados por típica relação de ordem estatutária ou de caráter jurídico-administrativo’” (DJ 4.2.2005).
12. A questão posta nos autos está solucionada por este Supremo Tribunal Federal, que, em diversas oportunidades, tem suspendido o processamento de ações ajuizadas perante a Justiça do Trabalho, nas quais se discute o vínculo jurídico estabelecido entre entidades da administração direta e indireta e seus ex-servidores, sejam eles contratados com fundamento em leis locais que autorizam a contratação por tempo determinado, por excepcional interesse público, ou mesmo quando contratados para exercerem cargos em comissão.
13. Na assentada de 17.3.2008, no julgamento da Reclamação n. 5.381/AM, de relatoria do Ministro Carlos Britto, na qual se examinava ação civil pública ajuizada perante a Justiça do Trabalho com o objetivo de impor o desligamento de servidores contratados por tempo determinado, o Plenário do Supremo Tribunal Federal decidiu:
“EMENTA: CONSTITUCIONAL. RECLAMAÇÃO. MEDIDA LIMINAR NA ADI 3.357. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. SERVIDORES PÚBLICOS. REGIME TEMPORÁRIO. JUSTIÇA DO TRABALHO. INCOMPETÊNCIA. 1. No julgamento da ADI 3.395-MC, este Supremo Tribunal suspendeu toda e qualquer interpretação do inciso I do artigo 114 da CF (na redação da EC 45/2004) que inserisse, na competência da Justiça do Trabalho, a apreciação de causas instauradas entre o Poder Público e seus servidores, a ele vinculados por típica relação de ordem estatutária ou de caráter jurídico-administrativo. 2. Contratações temporárias que se deram com fundamento na Lei amazonense nº 2.607/00, que minudenciou o regime jurídico aplicável às partes figurantes do contrato. Caracterização de vínculo jurídico-administrativo entre contratante e contratados. 3. Procedência do pedido. 4. Agravo regimental prejudicado” (DJ 8.8.2008).
Nos debates travados no julgamento daquela ação, os Ministros deste Supremo Tribunal assentaram que, diante do restabelecimento da redação original do art. 39, caput, da Constituição da República, os regimes jurídicos informadores das relações entre os Estados, o Distrito Federal e os Municípios e seus respectivos servidores seriam o estatutário e o regime jurídico-administrativo. Assim, o vínculo jurídico entre aquelas partes é de direito administrativo e, por isso mesmo, não comporta discussão perante a Justiça Trabalhista.
Na oportunidade, consignei que:
“Quando foi promulgada, a Constituição estabelecia, no artigo 39, o que desde 2 de agosto de 2007 este Plenário decidiu, suspendendo os efeitos da norma que tinha sido introduzida pela Emenda n. 19, e voltando, portanto, ao regime jurídico único [Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 2.135/DF]. E o que ela estabeleceu, parece-me, no artigo 37, inc. IX, foi que haveria um regime de servidores públicos assim considerados, conforme Vossa Excelência acaba de dizer, que é um estatuto, ou seja, um conjunto de direitos, deveres e responsabilidades daqueles que integram o serviço público e passam a ocupar ou a titularizar cargos públicos; esses são os servidores públicos ditos de provimento efetivo. Há um outro tipo de direitos, deveres e responsabilidades para aqueles que ocupam cargo comissionado(...)
E a Constituição estabelece um outro aspecto, o do art. 37, inc. IX: a contratação por necessidade temporária. E não significa que esses contratados serão submetidos a regime que não o administrativo, porque a Constituição estabelece ‘jurídico-administrativo’ (...)
Não se pode contratar pela CLT, porque, inclusive - estou chamando de novo a atenção -, quando esta Constituição foi promulgada, o artigo 39 estabelecia expressamente:
‘Art. 39. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituirão, no âmbito de sua competência, regime jurídico único ...’
E esse regime jurídico era administrativo para todos os casos, pela singela circunstância de que Estados e Municípios não podem instituir regime, porque legislar sobre Direito do Trabalho é competência privativa da União” (DJ 8.8.2008, grifos nossos).
Asseverei, ainda, que:
“Tudo isso que permeia a relação jurídico-administrativa foge à condição da Justiça Trabalhista, porque não é regime celetista (...), exatamente porque o que está na base de tudo isso é a relação de um ente público, para prestar serviço público. E, então, vou-me abster de dizer se ele estava correto ao contratar, às vezes, dizendo que era excepcional o interesse público, quando não era uma situação prevista, como a dessa professora. Isso leva eventualmente o Ministério Público a questionar essas situações, ao fundamento de que essas contratações, na verdade, estariam acontecendo para não se ter um concurso público. Mas não é na seara da Justiça Trabalhista que se tem de resolver isso, a solução é em outra seara.
Então, Excelência, pedi este aparte apenas para enfatizar que a doutrina e a jurisprudência sempre fizeram referência ao fato de que a relação jurídico-administrativa não comportava nada de regime celetista, máxime em se tratando de situações posteriores à Constituição de 1988, em cuja norma, inicialmente redigida no artigo 39, não se poderia ter senão o regime estatutário ou o regime jurídico-administrativo” (DJ 8.8.2008, grifos nossos).
Essa orientação foi confirmada pelo Ministro Cezar Peluso, que, nos apartes desta Reclamação, ressaltou:
“[Na data em que a Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 3.395/DF foi referendada] ainda não nos tínhamos pronunciado sobre a alteração do artigo 39, de modo que havia excepcionalmente casos que poderíamos entender regidos pela CLT. Mas hoje isso é absolutamente impossível, porque reconhecemos que a redação originária do artigo 39 prevalece. Em suma, não há possibilidade, na relação jurídica entre servidor e o Poder Público, seja ele permanente ou temporário, de ser regido senão pela legislação administrativa. Chame-se a isso relação estatutária, jurídico-administrativa, ou outro nome qualquer, o certo é que não há relação contratual sujeita à CLT. (...)
Sim, eu sei, mas estou apenas explicando por que a Emenda nº 45 deu essa redação [ao art. 114, inc. I, da Constituição da República] abrangendo os entes da administração direta, porque havia casos, com a vigência da Emenda nº 19, que, eventualmente, poderiam estar submetidos ao regime da CLT. Como a Emenda nº 19 caiu, nós voltamos ao regime original da Constituição, que não admite relação de sujeição à CLT, que é de caráter tipicamente privado, entre servidor público, seja estável ou temporário, e a Administração Pública” (DJ 8.8.2008, grifos nossos).
14. Esse entendimento foi reafirmado, em 21.8.2008, no julgamento do Recurso Extraordinário n. 573.202/AM, Relator o Ministro Ricardo Lewandowski, pendente de publicação.
Consta no sítio deste Supremo Tribunal Federal a seguinte notícia:
“Por maioria (7 votos a 1), o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) confirmou (...) jurisprudência preponderante na Corte no sentido de que a relação de emprego entre o Poder Público e seus servidores é sempre de caráter jurídico-administrativo e, portanto, a competência para dirimir conflitos entre as duas partes será sempre da Justiça Comum, e não da Justiça do Trabalho.
A decisão, à qual o Tribunal deu caráter de repercussão geral – casos que tenham maiores implicações para o conjunto da sociedade –, foi tomada no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 573202, interposto pelo governo do estado do Amazonas contra acórdão (decisão colegiada) do Tribunal Superior do Trabalho (TST).
(...)
Competência. Acompanhando o voto do relator, Ministro Ricardo Lewandowski, o Plenário do STF confirmou a tese sustentada pelo governo estadual. [O Ministro] Lewandowski citou uma série de precedentes do STF no mesmo sentido. Um deles é a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 3395, relatada pelo Ministro Cezar Peluso, em que o STF assentou o entendimento de que não cabe à Justiça Trabalhista, mas sim à Justiça Comum, estadual ou federal, dirimir conflitos da relação jurídico-administrativa entre o Poder Público e seus servidores.
‘Não há que se entender que a Justiça Trabalhista, a partir do texto promulgado (da nova Constituição de 1988) possa analisar questões relativas aos servidores públicos’, decidiu o Plenário. Essas demandas vinculadas a questões funcionais a eles pertinentes, regidos que são pela Lei 8.112/90 (Estatuto do Funcionalismo Público) e pelo Direito Administrativo, são diversas dos contratos de trabalho regidos pela CLT, conforme o entendimento dos ministros.
Votos. Em seu voto, o Ministro Ricardo Lewandowski observou, ainda, que o Plenário do [Supremo Tribunal Federal] já firmou entendimento pela competência da Justiça estadual, nos casos disciplinados por lei local com fundamento no artigo 106 da CF de 1967, nos termos da Emenda Constitucional (EC) nº 1/89. E disse que a Constituição de 1988 não alterou esse entendimento da Corte.
Para o Ministro Cezar Peluso, que acompanhou o relator, ‘não há possibilidade de a relação do Poder Público com seus servidores (qualquer relação) estar sujeita à CLT e, portanto, à Justiça do Trabalho’. Na mesma direção se pronunciou a Ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha. Segundo ela, ‘o vínculo (do servidor) com o estado tem caráter administrativo’.
[O Ministro] Cezar Peluso observou, a propósito, que a CLT não resolveria casos de emergência, como, por exemplo, a convocação de servidores no fim de semana, diante das exigências contidas na CLT” (grifos nossos).
15. Na mesma linha, em 21.8.2008, no julgamento da Reclamação n. 4.904/SE, de minha relatoria, o Plenário deste Tribunal assentou:
“EMENTA: RECLAMAÇÃO. CONTRATO TEMPORÁRIO. REGIME JURÍDICO ADMINISTRATIVO. DESCUMPRIMENTO DA AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE N. 3.395/DF. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA COMUM ESTADUAL.
1. Contrato firmado entre o Reclamante e o Interessado tem natureza jurídica administrativa, duração temporária e submete-se a regime específico, estabelecido pela Lei sergipana n. 2.781/1990, regulamentada pelo Decreto 11.203/1990.
2. Incompetência da Justiça Trabalhista para o processamento e o julgamento das causas que envolvam o Poder Público e servidores que sejam vinculados a ele por relação jurídico-administrativa. Precedentes.
3. Reclamação julgada procedente” (em fase de publicação – liberado no sistema).
No mesmo sentido, são precedentes os seguintes julgados do Plenário deste Supremo Tribunal Federal: Rcl 5.548/DF, Rcl 5.171/DF, Rcl 5.264/DF, Rcl 5.475/DF, Rcl 4.752/SE, todas de minha relatoria, e, ainda, a Rcl 4.012-AgR/MT, Rcl 4.054-AgR/AM e Rcl 4.489-AgR/PA, de relatoria do Ministro Marco Aurélio e para os quais fui designada Redatora, todas pendentes de publicação.
16. Na petição inicial da Ação Civil Pública n. 01778.2006.102.18.00.2, o Ministério Público do Trabalho ponderou:
“o [Programa Saúde da Família – PSF] é, na verdade, uma Política de Governo para a área de saúde e que já dura mais de 10 (dez) anos, não havendo que se falar em admissão temporária, (...) não cabendo, portanto, a forma de contratação até então adotada (credenciamento ou contrato temporário de prestação de serviços). (...)
Assim, diante da constatação de que houve contratação irregular de pessoal tanto para os chamados Programas Federais (PSF e PACS, dentre outros), quanto para o pessoal permanente do Município (...) é que se propõe a presente ação visando suspender em definitivo a prática de ‘CREDENCIAMENTO’, ‘CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA’, ou outra modalidade qualquer que não o concurso público, uma vez que a função não é temporária e que a contratação somente pode se dar mediante concurso público para o cargo ou emprego público permanente, pois, frise-se, não se trata de serviço temporário e o fato de a União Federal repassar recursos é apenas um incentivo para os municípios atenderem à comunidade carente (...)
Considerando-se que a ‘seleção para credenciamento’ em substituição ao necessário concurso público visa (...) preencher vagas temporárias certamente não pode ser de CARGOS PÚBLICOS [razão pela qual] há se concluir que o que buscou o Município foi selecionar trabalhadores para o preenchimento de EMPREGOS PÚBLICO, ou seja, para trabalhadores regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho (...)
Certamente que os empregados ‘temporários’ (credenciamento com prazo de duração e renovação) que o Município preencheu, sem o necessário concurso público, não podem ser entendidos como cargos públicos, mas empregos públicos e, como tal, irregulares, pois, em qualquer caso (cargo ou emprego permanentes) é exigível o certame” (fls. 92-96, grifos nossos).
De se ver que, no caso vertente, o Ministério Público do Trabalho ajuizou a mencionada ação para questionar a regularidade das contratações temporárias (credenciamentos temporários) de servidores da área de saúde, que desenvolviam suas funções no Programa de Saúde da Família – PSF e no Programa Agente Comunitário de Saúde – PACS.
De acordo com a orientação firmada por este Supremo Tribunal Federal nas decisões acima apontadas, dúvidas não remanescem de que os contratos de credenciamentos por prazo determinado celebrados entre o Município de Maurilândia/GO e seus servidores estão submetidos ao regime jurídico estatutário ou jurídico-administrativo, o que afasta a competência da Justiça do Trabalho para processar e julgar a causa.
17. Pelo exposto, por entender caracterizado desrespeito ao que ficou decidido por este Supremo Tribunal na Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 3.395/DF, julgo procedente a presente Reclamação e declaro a incompetência da Justiça do Trabalho para processar e julgar a Ação Civil Pública n. 01778.2006.102.18.00.2, determinando a remessa dos autos à Justiça comum estadual.
Julgo prejudicados os agravos regimentais interpostos pelo Ministério Público do Trabalho e pela Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho – ANPT.
Publique-se.
Arquive-se.
Brasília, 8 de outubro de 2008.
Ministra CÁRMEN LÚCIA
Relatora
RECLAMAÇÃO. CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. DESCUMPRIMENTO DE DECISÃO PROFERIDA NA AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 3.395-MC/DF. CONTRATO TEMPORÁRIO. CREDENCIAMENTO DE PROFISSIONAIS DA ÁREA DE SAÚDE. RECLAMAÇÃO JULGADA PROCEDENTE.
Relatório
1. Reclamação, com pedido de liminar, ajuizada em 26.1.2007, pelo Município de Maurilândia/GO contra ato do Juízo da 2ª Vara do Trabalho de Rio Verde/GO, que, ao processar a Ação Civil Pública n. 01778.2006.102.18.00.2, teria afrontado a autoridade da decisão proferida na Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 3.395/DF.
O caso
2. Em 1º.12.2006, o Ministério Público do Trabalho ajuizou a Ação Civil Pública n. 01778.2006.102.18.00.2, perante o Juízo da 2ª Vara do Trabalho de Rio Verde/GO, objetivando compelir o Município de Maurilândia a: “a) abster-se de proceder [à] admissão de pessoal mediante credenciamento ou contratação temporária sob a modalidade de excepcional interesse público para as atividades da área de saúde, inclusive, no que diz respeito a atendimento dos Programas de Saúde da Família – PSF e de Agentes Comunitários de Saúde – PACS, ressalvadas apenas as questões de endemias e calamidade pública; b) abster-se de admitir pessoal permanente mediante simples prova de título ou pela modalidade de credenciamento ou assemelhada, ressalvada a seleção pública de agentes comunitários de saúde que, de qualquer forma, deve obedecer os princípios que regem a administração pública; (...); d)realizar, no prazo de 06 (seis) meses, concurso público para provimento de todos os cargos e/ou empregos públicos necessários para a substituição [de] seus atuais profissionais ‘credenciados’ ou admitidos sem concurso público (...); e) afastar, no prazo de 30 (trinta) dias após concluído o certame público, todos profissionais ‘credenciados’ ou contratados sem concurso público, substituindo-os por profissionais concursados” (fl. 54).
Em 7.12.2006, o Juízo da 2ª Vara do Trabalho de Rio Verde/GO deferiu parcialmente a liminar pleiteada pelo Ministério Público “para determinar que o Município de Maurilândia: 1)[se] abst[ivesse] de contratar novos trabalhadores sem prévia aprovação em concurso público ou de seleção pública para os casos dos agentes comunitários de saúde (...) ; e que, 2) apresent[asse] (...) a relação e o contrato de todos os profissionais que compõem o Programa de Saúde da Família e o Programa de Agente Comunitário de Saúde, na data da audiência inicial” (fl. 33).
É contra o processamento da Ação Civil Pública n. 01778-2006-102-18-00-2 perante a Justiça do Trabalho a presente Reclamação.
3. O Reclamante alega, em síntese, que a decisão reclamada afrontaria a autoridade da decisão proferida por este Supremo Tribunal Federal no julgamento da Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 3.395/DF.
Argumenta que “os contratos estabelecidos entre o Município e os profissionais de saúde não se enquadra[riam] no conceito de relação de emprego, por se tratar de questão regulada na lei civil” (fl. 5).
Pede que seja reconhecida “a competência da Justiça Comum Estadual para processar e julgar a Ação Civil Pública, em desfavor do Reclamante” (fl. 22).
4. Em 16.2.2007, a autoridade reclamada prestou informações (fls. 89-90).
5. Em 26.2.2007, deferi a liminar pleiteada para determinar a suspensão da Ação Civil Pública n. 01778.2006.102.18.00.2, até decisão final da presente Reclamação (fls. 162-168).
6. Em 21.3.2007, determinei a devolução das Petições Avulsas ns. 31.797/2007, 31.798/2007 e 33.443/2007, protocoladas pela Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho – ANPT, por considerar que a peticionária não teria sido admitida como amicus curiae na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 3.395/DF e, tampouco, sido parte ação civil pública objeto desta Reclamação (fls. 179-184).
7. Em 15.3.2007, o Ministério Público do Trabalho pleiteou a reconsideração da decisão que deferiu a medida liminar ou o julgamento pelo colegiado de agravo regimental (fls. 187-199).
Na oportunidade, defendeu a competência da Justiça do Trabalho para processar e julgar aquela ação, ao argumento de que o Município não teria demonstrado que “os trabalhadores potencialmente atingidos pela ação civil pública 01778-2006-102-18-00-2 est[ariam] investidos em cargos públicos ou em comissão (...) [não comprovando] o caráter institucional (em sentido estrito) das relações laborais em análise” (fl. 197).
8. Em 9.4.2007, a Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho – ANPT requereu “em sede de juízo de retratação, seja reconsiderado o despacho que indeferiu as Petições Avulsas STF n[s]. 31.797/2007, 31798/2007 e 33.443/2007 e determinou sua devolução à Agravante, prosseguindo o regular processamento do Agravo Regimental interposto contra a decisão que suspendeu a ação civil pública 01778.2006.102.18.00.2 em curso na 2ª Vara do Trabalho de Rio Verde-GO” (fl. 209).
9. O Procurador-Geral da República, em 3.4.2006, manifestou-se pelo não conhecimento do agravo regimental interposto pelo Ministério Público do Trabalho, ante sua ilegitimidade para atuar perante este Supremo Tribunal Federal. No mérito, opinou pela improcedência desta Reclamação, por entender que o Reclamante não teria comprovado “a natureza estatutária ou jurídico-administrativa do vínculo estabelecido entre os servidores e o poder público” (fls. 237).
Examinados os elementos havidos nos autos, DECIDO.
10. O que se põe em foco nesta Reclamação é a competência da Justiça do Trabalho para processar e julgar ação que versa, em essência, sobre a relação jurídica estabelecida entre servidores contratados temporariamente mediante ajuste de credenciamento e a Administração Pública, fundamentando-se o Reclamante na decisão da Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 3.395/DF.
11. Em 5.4.2006, no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 3.395/DF, este Supremo Tribunal Federal, por maioria, referendou cautelar deferida pelo Ministro Nelson Jobim, cujos termos são os seguintes:
“EMENTA: INCONSTITUCIONALIDADE. Ação direta. Competência. Justiça do Trabalho. Incompetência reconhecida. Causas entre o Poder Público e seus servidores estatutários. Ações que não se reputam oriundas de relação de trabalho. Conceito estrito desta relação. Feitos da competência da Justiça Comum. Interpretação do art. 114, inc. I, da CF, introduzido pela EC 45/2004. Precedentes. Liminar deferida para excluir outra interpretação. O disposto no art. 114, I, da Constituição da República, não abrange as causas instauradas entre o Poder Público e servidor que lhe seja vinculado por relação jurídico-estatutária” (DJ 10.11.2006).
Na decisão pela qual deferiu a medida liminar, ad referendum, o Ministro Nelson Jobim consignou:
“Dou interpretação conforme ao inciso I do art. 114 da CF, na redação da EC n. 45/2004. Suspendo, ad referendum, toda e qualquer interpretação dada ao inciso I do art. 114 da CF, na redação dada pela EC 45/2004, que inclua, na competência da Justiça do Trabalho, a ‘(...) apreciação (...) de causas que (...) sejam instauradas entre o Poder Público e seus servidores, a ele vinculados por típica relação de ordem estatutária ou de caráter jurídico-administrativo’” (DJ 4.2.2005).
12. A questão posta nos autos está solucionada por este Supremo Tribunal Federal, que, em diversas oportunidades, tem suspendido o processamento de ações ajuizadas perante a Justiça do Trabalho, nas quais se discute o vínculo jurídico estabelecido entre entidades da administração direta e indireta e seus ex-servidores, sejam eles contratados com fundamento em leis locais que autorizam a contratação por tempo determinado, por excepcional interesse público, ou mesmo quando contratados para exercerem cargos em comissão.
13. Na assentada de 17.3.2008, no julgamento da Reclamação n. 5.381/AM, de relatoria do Ministro Carlos Britto, na qual se examinava ação civil pública ajuizada perante a Justiça do Trabalho com o objetivo de impor o desligamento de servidores contratados por tempo determinado, o Plenário do Supremo Tribunal Federal decidiu:
“EMENTA: CONSTITUCIONAL. RECLAMAÇÃO. MEDIDA LIMINAR NA ADI 3.357. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. SERVIDORES PÚBLICOS. REGIME TEMPORÁRIO. JUSTIÇA DO TRABALHO. INCOMPETÊNCIA. 1. No julgamento da ADI 3.395-MC, este Supremo Tribunal suspendeu toda e qualquer interpretação do inciso I do artigo 114 da CF (na redação da EC 45/2004) que inserisse, na competência da Justiça do Trabalho, a apreciação de causas instauradas entre o Poder Público e seus servidores, a ele vinculados por típica relação de ordem estatutária ou de caráter jurídico-administrativo. 2. Contratações temporárias que se deram com fundamento na Lei amazonense nº 2.607/00, que minudenciou o regime jurídico aplicável às partes figurantes do contrato. Caracterização de vínculo jurídico-administrativo entre contratante e contratados. 3. Procedência do pedido. 4. Agravo regimental prejudicado” (DJ 8.8.2008).
Nos debates travados no julgamento daquela ação, os Ministros deste Supremo Tribunal assentaram que, diante do restabelecimento da redação original do art. 39, caput, da Constituição da República, os regimes jurídicos informadores das relações entre os Estados, o Distrito Federal e os Municípios e seus respectivos servidores seriam o estatutário e o regime jurídico-administrativo. Assim, o vínculo jurídico entre aquelas partes é de direito administrativo e, por isso mesmo, não comporta discussão perante a Justiça Trabalhista.
Na oportunidade, consignei que:
“Quando foi promulgada, a Constituição estabelecia, no artigo 39, o que desde 2 de agosto de 2007 este Plenário decidiu, suspendendo os efeitos da norma que tinha sido introduzida pela Emenda n. 19, e voltando, portanto, ao regime jurídico único [Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 2.135/DF]. E o que ela estabeleceu, parece-me, no artigo 37, inc. IX, foi que haveria um regime de servidores públicos assim considerados, conforme Vossa Excelência acaba de dizer, que é um estatuto, ou seja, um conjunto de direitos, deveres e responsabilidades daqueles que integram o serviço público e passam a ocupar ou a titularizar cargos públicos; esses são os servidores públicos ditos de provimento efetivo. Há um outro tipo de direitos, deveres e responsabilidades para aqueles que ocupam cargo comissionado(...)
E a Constituição estabelece um outro aspecto, o do art. 37, inc. IX: a contratação por necessidade temporária. E não significa que esses contratados serão submetidos a regime que não o administrativo, porque a Constituição estabelece ‘jurídico-administrativo’ (...)
Não se pode contratar pela CLT, porque, inclusive - estou chamando de novo a atenção -, quando esta Constituição foi promulgada, o artigo 39 estabelecia expressamente:
‘Art. 39. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituirão, no âmbito de sua competência, regime jurídico único ...’
E esse regime jurídico era administrativo para todos os casos, pela singela circunstância de que Estados e Municípios não podem instituir regime, porque legislar sobre Direito do Trabalho é competência privativa da União” (DJ 8.8.2008, grifos nossos).
Asseverei, ainda, que:
“Tudo isso que permeia a relação jurídico-administrativa foge à condição da Justiça Trabalhista, porque não é regime celetista (...), exatamente porque o que está na base de tudo isso é a relação de um ente público, para prestar serviço público. E, então, vou-me abster de dizer se ele estava correto ao contratar, às vezes, dizendo que era excepcional o interesse público, quando não era uma situação prevista, como a dessa professora. Isso leva eventualmente o Ministério Público a questionar essas situações, ao fundamento de que essas contratações, na verdade, estariam acontecendo para não se ter um concurso público. Mas não é na seara da Justiça Trabalhista que se tem de resolver isso, a solução é em outra seara.
Então, Excelência, pedi este aparte apenas para enfatizar que a doutrina e a jurisprudência sempre fizeram referência ao fato de que a relação jurídico-administrativa não comportava nada de regime celetista, máxime em se tratando de situações posteriores à Constituição de 1988, em cuja norma, inicialmente redigida no artigo 39, não se poderia ter senão o regime estatutário ou o regime jurídico-administrativo” (DJ 8.8.2008, grifos nossos).
Essa orientação foi confirmada pelo Ministro Cezar Peluso, que, nos apartes desta Reclamação, ressaltou:
“[Na data em que a Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 3.395/DF foi referendada] ainda não nos tínhamos pronunciado sobre a alteração do artigo 39, de modo que havia excepcionalmente casos que poderíamos entender regidos pela CLT. Mas hoje isso é absolutamente impossível, porque reconhecemos que a redação originária do artigo 39 prevalece. Em suma, não há possibilidade, na relação jurídica entre servidor e o Poder Público, seja ele permanente ou temporário, de ser regido senão pela legislação administrativa. Chame-se a isso relação estatutária, jurídico-administrativa, ou outro nome qualquer, o certo é que não há relação contratual sujeita à CLT. (...)
Sim, eu sei, mas estou apenas explicando por que a Emenda nº 45 deu essa redação [ao art. 114, inc. I, da Constituição da República] abrangendo os entes da administração direta, porque havia casos, com a vigência da Emenda nº 19, que, eventualmente, poderiam estar submetidos ao regime da CLT. Como a Emenda nº 19 caiu, nós voltamos ao regime original da Constituição, que não admite relação de sujeição à CLT, que é de caráter tipicamente privado, entre servidor público, seja estável ou temporário, e a Administração Pública” (DJ 8.8.2008, grifos nossos).
14. Esse entendimento foi reafirmado, em 21.8.2008, no julgamento do Recurso Extraordinário n. 573.202/AM, Relator o Ministro Ricardo Lewandowski, pendente de publicação.
Consta no sítio deste Supremo Tribunal Federal a seguinte notícia:
“Por maioria (7 votos a 1), o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) confirmou (...) jurisprudência preponderante na Corte no sentido de que a relação de emprego entre o Poder Público e seus servidores é sempre de caráter jurídico-administrativo e, portanto, a competência para dirimir conflitos entre as duas partes será sempre da Justiça Comum, e não da Justiça do Trabalho.
A decisão, à qual o Tribunal deu caráter de repercussão geral – casos que tenham maiores implicações para o conjunto da sociedade –, foi tomada no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 573202, interposto pelo governo do estado do Amazonas contra acórdão (decisão colegiada) do Tribunal Superior do Trabalho (TST).
(...)
Competência. Acompanhando o voto do relator, Ministro Ricardo Lewandowski, o Plenário do STF confirmou a tese sustentada pelo governo estadual. [O Ministro] Lewandowski citou uma série de precedentes do STF no mesmo sentido. Um deles é a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 3395, relatada pelo Ministro Cezar Peluso, em que o STF assentou o entendimento de que não cabe à Justiça Trabalhista, mas sim à Justiça Comum, estadual ou federal, dirimir conflitos da relação jurídico-administrativa entre o Poder Público e seus servidores.
‘Não há que se entender que a Justiça Trabalhista, a partir do texto promulgado (da nova Constituição de 1988) possa analisar questões relativas aos servidores públicos’, decidiu o Plenário. Essas demandas vinculadas a questões funcionais a eles pertinentes, regidos que são pela Lei 8.112/90 (Estatuto do Funcionalismo Público) e pelo Direito Administrativo, são diversas dos contratos de trabalho regidos pela CLT, conforme o entendimento dos ministros.
Votos. Em seu voto, o Ministro Ricardo Lewandowski observou, ainda, que o Plenário do [Supremo Tribunal Federal] já firmou entendimento pela competência da Justiça estadual, nos casos disciplinados por lei local com fundamento no artigo 106 da CF de 1967, nos termos da Emenda Constitucional (EC) nº 1/89. E disse que a Constituição de 1988 não alterou esse entendimento da Corte.
Para o Ministro Cezar Peluso, que acompanhou o relator, ‘não há possibilidade de a relação do Poder Público com seus servidores (qualquer relação) estar sujeita à CLT e, portanto, à Justiça do Trabalho’. Na mesma direção se pronunciou a Ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha. Segundo ela, ‘o vínculo (do servidor) com o estado tem caráter administrativo’.
[O Ministro] Cezar Peluso observou, a propósito, que a CLT não resolveria casos de emergência, como, por exemplo, a convocação de servidores no fim de semana, diante das exigências contidas na CLT” (grifos nossos).
15. Na mesma linha, em 21.8.2008, no julgamento da Reclamação n. 4.904/SE, de minha relatoria, o Plenário deste Tribunal assentou:
“EMENTA: RECLAMAÇÃO. CONTRATO TEMPORÁRIO. REGIME JURÍDICO ADMINISTRATIVO. DESCUMPRIMENTO DA AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE N. 3.395/DF. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA COMUM ESTADUAL.
1. Contrato firmado entre o Reclamante e o Interessado tem natureza jurídica administrativa, duração temporária e submete-se a regime específico, estabelecido pela Lei sergipana n. 2.781/1990, regulamentada pelo Decreto 11.203/1990.
2. Incompetência da Justiça Trabalhista para o processamento e o julgamento das causas que envolvam o Poder Público e servidores que sejam vinculados a ele por relação jurídico-administrativa. Precedentes.
3. Reclamação julgada procedente” (em fase de publicação – liberado no sistema).
No mesmo sentido, são precedentes os seguintes julgados do Plenário deste Supremo Tribunal Federal: Rcl 5.548/DF, Rcl 5.171/DF, Rcl 5.264/DF, Rcl 5.475/DF, Rcl 4.752/SE, todas de minha relatoria, e, ainda, a Rcl 4.012-AgR/MT, Rcl 4.054-AgR/AM e Rcl 4.489-AgR/PA, de relatoria do Ministro Marco Aurélio e para os quais fui designada Redatora, todas pendentes de publicação.
16. Na petição inicial da Ação Civil Pública n. 01778.2006.102.18.00.2, o Ministério Público do Trabalho ponderou:
“o [Programa Saúde da Família – PSF] é, na verdade, uma Política de Governo para a área de saúde e que já dura mais de 10 (dez) anos, não havendo que se falar em admissão temporária, (...) não cabendo, portanto, a forma de contratação até então adotada (credenciamento ou contrato temporário de prestação de serviços). (...)
Assim, diante da constatação de que houve contratação irregular de pessoal tanto para os chamados Programas Federais (PSF e PACS, dentre outros), quanto para o pessoal permanente do Município (...) é que se propõe a presente ação visando suspender em definitivo a prática de ‘CREDENCIAMENTO’, ‘CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA’, ou outra modalidade qualquer que não o concurso público, uma vez que a função não é temporária e que a contratação somente pode se dar mediante concurso público para o cargo ou emprego público permanente, pois, frise-se, não se trata de serviço temporário e o fato de a União Federal repassar recursos é apenas um incentivo para os municípios atenderem à comunidade carente (...)
Considerando-se que a ‘seleção para credenciamento’ em substituição ao necessário concurso público visa (...) preencher vagas temporárias certamente não pode ser de CARGOS PÚBLICOS [razão pela qual] há se concluir que o que buscou o Município foi selecionar trabalhadores para o preenchimento de EMPREGOS PÚBLICO, ou seja, para trabalhadores regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho (...)
Certamente que os empregados ‘temporários’ (credenciamento com prazo de duração e renovação) que o Município preencheu, sem o necessário concurso público, não podem ser entendidos como cargos públicos, mas empregos públicos e, como tal, irregulares, pois, em qualquer caso (cargo ou emprego permanentes) é exigível o certame” (fls. 92-96, grifos nossos).
De se ver que, no caso vertente, o Ministério Público do Trabalho ajuizou a mencionada ação para questionar a regularidade das contratações temporárias (credenciamentos temporários) de servidores da área de saúde, que desenvolviam suas funções no Programa de Saúde da Família – PSF e no Programa Agente Comunitário de Saúde – PACS.
De acordo com a orientação firmada por este Supremo Tribunal Federal nas decisões acima apontadas, dúvidas não remanescem de que os contratos de credenciamentos por prazo determinado celebrados entre o Município de Maurilândia/GO e seus servidores estão submetidos ao regime jurídico estatutário ou jurídico-administrativo, o que afasta a competência da Justiça do Trabalho para processar e julgar a causa.
17. Pelo exposto, por entender caracterizado desrespeito ao que ficou decidido por este Supremo Tribunal na Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 3.395/DF, julgo procedente a presente Reclamação e declaro a incompetência da Justiça do Trabalho para processar e julgar a Ação Civil Pública n. 01778.2006.102.18.00.2, determinando a remessa dos autos à Justiça comum estadual.
Julgo prejudicados os agravos regimentais interpostos pelo Ministério Público do Trabalho e pela Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho – ANPT.
Publique-se.
Arquive-se.
Brasília, 8 de outubro de 2008.
Ministra CÁRMEN LÚCIA
Relatora
3 comentários:
Caro Maxsuel,
Permita-me opinar. A Decisão do STF sobre a incompetência de Justiça do Trabalho para julgar lides envolvendo contratados pelo Poder Público é direcionada, apenas, aos casos em que há lei municipal, específica, discorrendo sobre o regime administrativo em que se deram as contratações, o que por óbvio afasta o preceito celetista da matéria. Não obstante, nas contratações irregulares ou realizadas sem o amparo de norma administrativa específica, onde se tenha assinatura da CTPS pelo Ente Público, sem adentrar a legalidade de tal contratação, entendo que a Justiça do Trabalho continua competente, eis que ausente estará o caráter estatutário que alicerçou a decisão do Pretório Excelso. Nas demais contratações, por interposta pessoa, com fulcro no instituto de terceirização, entendo não haver qualquer dúvida sobre a competência da JT, mantida na íntegra a Súmula 331, IV do c. TST.
Sugiro que acompanhe também a questio envolvendo a competência do TST para ações indenizatórias propostas por sucesores de finados trabalhadores, em direito próprio, em lides de acidente de trabalho, pois há grande pressão (inclusive da ANAMATRA)para revogação da Súmula 366 do STJ, o que particularmente entendo como um erro. Depois falaremos mais sobre o assunto.
Sem mais a acrescer, deixo um abraço ao amigo.
José Eduardo - Advogado
Caro amigo Dr. José Eduardo.
Concordo plenamente com seu entendimento. Que me parecer que o caso examinado pelo STF, se refere às Ações Propostas Pelo Ministério Público em face dos Municípios, questionando os contratos de Terceirização. Entendo, também, que nos casos de terceirização é de se adotar a Sumula 331 do C. TST.
Boa Tarde!
Li na íntegra a decisão do STF e não encontrei manifestação acerca da terceirização. A minha dúvida é se a decisão pode ser argumentada, também, nos casos de terceirização de mão de obra, dentro do serviço público.
Grata!
Jane Marques
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